quinta-feira, 24 de junho de 2010

Luis XIX, O Fabuloso

[Brasil x Costa do Marfim]

Do peso e ansiedade da estreia sobrou a leveza do futebol implacável. Do jejum alardeado aos quatro ventos e cinco continentes, o silêncio com os seis dedos em riste. O Brasil foi mais Luis Fabiano, Luis Fabiano foi mais Brasil. Do triângulo perfeito, refez-se nosso atalho certeiro para o caminho do gol: Robinho, Kaká e ele, dono da camisa que o maior artilheiro da História das Copas vestia.

Tímido. Inofensivo. Em crise indesculpável a um jogador que se propõe a ser artilheiro. Havia até quem já andasse dizendo “Copa do Mundo? Não é pra ele”. Das críticas fundamentadas e das passionais, das picuinhas para vender notícia e do ufanismo às avessas, ficou a imagem do corpo desajeitado a sair do chão depois de imprimir no pé direito a força de cento e noventa milhões de impacientes. Do petardo cheio de ódio e de amor, restou o arqueiro marfinense a ouvir o barulho da bola quando a bola já havia passado. Eis o gozo reprimido por quinhentos e sessenta e cinco minutos. O desafogo agressivo e sereno, um gol fabiano de Luís Fabuloso. Brasil um a zero.

Será que é pouco pra calar tanta gente? Pois não seja por isso... os olhos arregalados de predador fitam a bola que vem do alto, o corpo de novo desajeitado a domina no braço e o primeiro adversário fica pra trás. O segundo chega manso, só deixa o corpo na frente na vã tentativa de deter o algoz em sua fúria solitária. Chapéu nele. O terceiro africano chega pulando, braços e pernas abertos, mas Luis não o distingue do colega: chapéu nele também. E o primeiro, aquele lá de trás, enciumado, insiste em participar dos retoques finais... atordoado com a chapelaria do canarinho mulato, porém, dá com as ancas no chão e permite que o artista conclua sua obra no contrapé do goleiro (ainda a procurar a bola do primeiro gol). Luis dois a zero.

Opa! Mas vale com a mão também? A autoridade do árbitro se esvai frente à maestria do goleador brasileiro. Numa Copa morna e carente de gols, prioridade ao bom futebol. As regras, só depois – se for o caso. O francês ri, gesticula a questionar – ou admirar? – a marotagem do nosso menino. Suas palavras inaudíveis, se pudessem ser ditas ao mundo inteiro sem a demagogia travestida da ética, seriam bem simples: “A jogava estava tão linda que eu não poderia pará-la”. A História da Arte também depõe em nosso favor: as maiores pinturas de todos os tempos contaram com o auxílio inestimável de quem? Deles, os braços.

Matador. Craque. Herói. Num jogo onde também houve Kaká, Elano, Felipe Mello e o abraço emblemático de Lúcio, Maicon e Júlio César, Luis Fabiano reinou. O Fabuloso despertou e assinou com os pés e os braços, em verde e amarelo, a classificação antecipada para a próxima fase. Que venha Portugal.

3 comentários:

  1. Quando não estou comemorando gols do meu Velo Clube, vou ver jogo do tricolor no Morumbi.
    Lá, cansei de ver esse cara marcar.
    Finalizador dos bons, dava três chutes numa partida e marcava dois gols.
    A bola caia nos pés dele e eu já levantava na torcida.

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  2. Fabuloso mesmo foi vibrar com essas pinturas da bola no nosso boteco cheio de cevada a abraços. Show, irmão!

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